Sinergia - Como Calcular a Geração de Valor em Transações de M&A
Uma transação de M&A se justifica quando a somatória das empresas após a transação geram valor maior do que as empresas operando individualmente (1 + 1 > 2). Este valor gerado a partir de uma fusão ou aquisição é chamado de sinergia.
Isto siginifica que um empresário pode vender a sua empresa por mais do que o seu valor justo (fair value), para isto, é necessáio que se identifique não só o valor justo da empresa, mas qual o valor agregado da companhia em uma nova estrutura, fazendo parte de uma grande corporação por exemplo.
O valor de uma empresa é relativo, isto é, o valor da mesma empresa difere de acordo com o agente devido às sinergias. Isto significa que a mesma empresa tem um valor para o seu fundador que é diferente do valor da mesma empresa para um potencial investidor, pois este pode agregar serviços, faturamento, redução de custos e de risco no negócio.
Vamos imaginar uma empresa regional cujo negócio seja um market place de anúncios de imóveis. Esta empresa possui toda a estrutura necessária para seu funcionamento (escritório, pessoal administrativo, TI, RH, comercial, marketing, etc.). Vamos chamar esta empresa de Imob.Co.
Para simplificar, vamos imaginar que o valor justo para a Imob.Co seja de 10x EBITDA.
Para calcularmos o valor justo da empresa na métrica de múltiplo acima, o primeiro passo é apurarmos o EBITDA da Imob.Co. Levantamos que esta plataforma de imóveis possui os seguintes dados financeiros:
(+) Receita Líquida: R$ 25,0 milhões
(-) Custos e despesas operacionais: R$ 10,0 milhões
(-) Despesas com pessoal: R$ 12,0 milhões
(=) EBITDA: R$ 3,0 milhões
No múltiplo informado de 10x EBITDA, teríamos que o valor justo para a companhia Imob.Co seria de R$ 30,0 milhões (10x R$ 3,0MM).
Este é o valor da empresa no cenário stand-alone (continuando a ser gerida pelos sócios atuais), ou seja, assumindo que a empresa não sofrerá mudanças relevantes em sua estrutura, quadro societário, etc. Logo, este é o valor da empresa na visão de seus atuais sócios.
Agora vamos imaginar que uma empresa concorrente, do mesmo setor, de maior porte, com faturamento de R$ 300,0 milhões, atuando nacionalmente, esteja interessada em comprar a Imob.Co. Quanto a empresa Imob.Co gera de valor na visão dos sócios da empresa compradora?
Analisando detalhadamente as estruturas de custos das duas empresas, os gestores da empresa compradora chegaram à seguinte conclusão:
Despesas administrativas: conseguimos absorver parte das despesas administrativas da Imob.Co, gerando uma economia de R$ 1,0 milhão.
Fornecedores: Percebemos que na maior parte dos fornecedores em comum, nós temos uma melhor negociação de preços, ao incorporar a Imob.Co, iremos praticar nossas negociações de preços, o que gerará uma economia de R$ 1,5 milhões na Imob.Co.
Pessoal: Conseguimos absorver parte do pessoal de TI, RH e administrativo da Imob.Co, gerando uma economia estimada para a Imob.Co de R$ 3,0 milhões.
Total de economia gerada na Imob.Co após a transação: R$ 5,5 milhões.
Isto significa que, mantendo o mesmo patamar de faturamento, o novo EBTIDA da Imob.Co seria maior em R$ 5,5 milhões, desconsiderando gastos com assessores e rescisão, como segue:
EBITDA após transação: R$ 8,5 milhões (EBITDA stand-alone + Economia de custos = R$ 3,0 + R$ 5,5).
Este é o quanto a Imob.Co gera de EBITDA ao ser absorvida pela empresa compradora, um EBITDA superior aos R$ 3,0 gerados pela empresa no cenário stand-alone.
Assumindo que a empresa valha o mesmo múltiplo de 10x EBITDA, vamos analisar quanto seria o valor da Imob.Co na visão de seus acionistas e o valor da Imob.Co na visão da empresa compradora:
Valor Imob.Co stand-alone = 10x R$ 3,0MM (EBITDA) = R$ 30,0 milhões
Valor Imob.Co compradora = 10 x R$ 8,5MM (EBITDA pós transação) = R$ 85,0 milhões
Isto significa que os fundadores da Imob.Co venderiam a empresa pelo seu valor justo de R$ 30,0 milhões, pois é quanto a empresa vale na sua visão. Porém, a empresa compradora estaria disposta a pagar até R$ 85,0 milhões pela mesma empresa, pois este é o valor da empresa na sua estrutura.
A diferença entre os valores é a geração de valor, ou seja, a sinergia gerada pela transação, mostrando que, neste caso, as empresas juntas valem mais do que separadas. Neste caso, o valor da sinergia é de R$ 55,0 milhões (R$ 85,0 – 30,0).
Em outras palavras, vender a Imob.Co por qualquer valor acima de R$ 30,0 milhões será viável para os os fundadores da Imob.Co, uma vez que estariam vendendo a sua empresa por mais do que seu “valor justo”. Já para os compradores, pagar qualquer valor abaixo de R$ 85,0 milhões pela Imob.Co estaria trazendo valor adicional para a empresa compradora, uma vez que estariam pagando menos do que seu valor justo na visão dos compradores de R$ 85,0 milhões.
Neste momento, o assessor de M&A que estiver assessorando a Imob.Co deve identificar esta sinergia e tentar vender pelo valor mais próximo de R$ 85,0 milhões possível. Já o assessor da empresa compradora deverá negociar valores mais próximos de R$ 30,0 milhões de maneira que seu cliente comprador se aproprie da maior parte da sinergia gerada, mas tendo em mente que qualquer valor entre R$ 30MM e R$ 85MM é viável tanto para os compradores quanto para os vendedores.
Se a empresa compradora concordar em pagar, por exemplo, R$ 40,0 milhões pela Imob.Co, esta seria uma transação onde todos sairiam ganhando, pois vendedor vendeu mais caro que seu valor justo e comprador pagou mais barato que seu valor justo. Neste exemplo, os sócios da Imob.Co receberiam R$ 10,0 milhões a mais do que quanto sua empresa vale no cenário stand-alone, enquanto que os compradores estariam se apropriando de um valor de R$ 45,0 milhões a mais do que pagaram pela companhia (R$ 85,0 – 40,0).
O gráfico abaixo exemplifica a geração de valor em transações de M&A:
Enterprise Value: Valor justo da Imob.Co no cenário stand-alone.
Subtraindo-se a dívida e somando-se o caixa, chegamos no Equity Value, que é o quanto os acionistas da empresa vendedora receberiam pela sua venda ao valor justo.
A partir do valor justo, temos várias possibilidades de sinergia, que no gráfico acima exemplificamos apenas 3:
Sinergia de Crescimento:
A sinergia de crescimento ocorre quando existem serviços complementares entre as empresas e que tanto os serviços da vendedora poderão ser vendidos para os clientes da compradora, como também os serviços da compradora poderão ser vendidos para os clientes da vendedora, o que geraria aumento de faturamento para ambas nos mesmos clientes.
o Vamos imaginar um outro exemplo onde os serviços são os mesmos, mas ainda assim há sinergia de crescimento. Imagine que uma agência de publicidade com contratos globais e sem presença no Brasil decide adquirir uma agência de publicidade local no Brasil: Após a aquisição, a agência de publicidade agora poderá prestar serviços para seus clientes globais também no Brasil, onde ainda não atendiam seus clientes, mas como seus contratos são globais, após adquirirem uma empresa no Brasil, estarão aptos a atender seus clientes globais no Brasil também, gerando uma receita que não possuíam, já que não atendiam estes clientes no Brasil. Além de gerar também receita adicional de clientes globais para a empresa vendedora que não possuía aqueles clientes antes da transação.
Sinergia de Eficiência: A sinergia de eficiência ocorre em linha com o exemplo que demos da Imob.Co acima, onde a empresa compradora consegue absorver parte dos custos e despesas da empresa vendedora, gerando redução de custos e aumento de lucros.
Sinergia de Risco:
Assumindo que uma empresa vale hoje o quanto ela gerará de caixa no futuro, trazidos a valor presente a uma taxa de desconto.
A taxa de desconto utilizada para trazer os fluxos de caixa a valor presente representam, de maneira simplificada, o risco de os fluxos de caixa futuros ocorrerem.
Vamos supor que os títulos públicos, considerados investimentos livre de risco, estejam pagando de juros o equivalente a 6% ao ano sobre o capital investido.
Para que um investidor opte por não investir em títulos públicos e investir em uma empresa, esta empresa deverá gerar de fluxos de caixa futuros que resultem em um retorno superior aos 6% gerados pela aplicação em títulos públicos para compensar o risco que este investidor está correndo. Se o retorno for equivalente, o investidor sempre escolherá o investimento de menor risco, de forma que para investir em negócios de risco superior aos títulos públicos, o investidor busca também retornos muito superiores.
Temos então que a taxa de desconto será uma composição de custo de oportunidade + o risco daqueles fluxos de caixa futuros.
Continuando, se temos duas empresas, uma pequena e local, seu risco é alto e consequentemente sua taxa de desconto vai ser alta, o que implicará em um valuation mais baixo (ao trazer os fluxos de caixa futuros a valor presente, quanto maior a taxa de desconto, menor o valor presente).
Mas caso uma multinacional adquira esta empresa local, temos intuitivamente que o risco da multinacional seja menor do que a da empresa adquirida que será incorporada na empresa multinacional. Desta maneira, quando a multinacional compra a empresa local e esta passa a fazer parte de uma estrutura global e seu risco é reduzido.
Ao se reduzir o seu risco por fazer parte de de uma estrutura maior e global, sua taxa de desconto cai e seu valor consequentemente aumenta. Assumindo a mesma projeção de geração de caixa futuro, o simples fato de reduzir o risco (reduzir a taxa de desconto) faz com que o valor da empresa aumente. A diferença de valor entre a taxa de desconto para a empresa independente e a taxa para a multinacional é a sinergia gerada pelo risco.
Após análise das principais sinergias apontadas no gráfico, a negociação será viável para os compradores e vendedores se negociarem na faixa de negociação entre o valor justo para os acionistas atuais e o valor justo para a empresa compradora.
Mas nem tudo são rosas, existem também, claro, casos em que existe perda de valor na transação, o que faria com que não fosse viável uma aquisição, ou seja, as empresas separadas valeriam mais do que as empresas após fusão. Por exemplo:
Tributos: Imagine uma empresa de pequeno porte que tenha benefício do simples nacional como pagamento de tributos, após ser adquirida pela empresa maior que adote regime de tributação no Lucro Real, a empresa adquirida, ao ser incorporada, passará a pagar impostos no Lucro Real e, provavelmente pagará mais impostos do que se não for vendida para a empresa maior.
Equiparação de salários e benefícios: Empresas multinacionais tendem a ter pacotes de benefícios melhores para seus funcionários do que empresas de pequeno e médio porte, se isto ocorrer, após a aquisição, a empresa menor passaria a pagar os mesmos benefícios da multinacional para seus funcionários, o que levaria a um aumento de custos.
Exclusividade de clientes:
Alguns clientes podem solicitar exclusividade da empresa para seu setor. Por exemplo, se uma empresa atende exclusivamente a Coca-Cola, ela não poderá atender a Ambev por exemplo, pois é exclusiva da Coca-cola no segmento de bebidas.
Neste contexto, pode acontecer de uma empresa atender a Coca-Cola e outra a Ambev. Após a transação, as empesas em conjunto terão que escolher se continuarão atendendo a Coca-Cola ou a Ambev, então acabarão por perder um dos dois clientes. Este caso é muito comum em fusão e incorporação de agências de publicidade.
Neste caso, haveria perda de valor já que o volume de clientes das empresas separadas é maior do que o volume de clientes que as empresas teriam após se juntarem.
Nem sempre é fácil identificar o valor das sinergias que as empresas terão em conjunto, pois no caso do comprador, ele não terá interesse em informar seus números para a empresa vendedora. Por isso é de extrema importância que as empresas, ao buscarem uma venda estratégica para uma corporação maior, acertem na contratação de uma boa assessoria de M&A, pois este, com sua experiência, será capaz de identificar sinergias e instruir bem os empresários para a melhor negociação possível, gerando valor a estes.
O assessor deverá ser capaz de calcular o quanto a empresa “vale” para os fundadores e para os compradores. Caso haja uma grande diferença de valores, então o delta é a faixa de negociação esperada que será entre o fair value para os vendedores e o fair value para os compradores.
Claro que estes valores devem ser compensados pelos custos da transação como por exemplo: custo de rescisão de funcionários, equiparação salarial, custo de assessores, advogados, entre outros.
Desta maneira, a transação será viável se a somatória das sinergias superarem a somatória das perdas.
Lembrando também que, é claro, estamos falando exclusivamente de valor, e valor é algo diferente de preço.
Preço segue a regra da oferta e da demanda, se você tem uma empresa que vale R$ 100,0 milhões, mas somente encontrou compradores dispostos a pagar R$ 80,0 milhões, esta é uma questão a ser discutida entre empresários e assessores e que compreenderão vários pontos qualitativos como:
O empresário tem plano de sucessão?
O empresário quer continuar no negócio ou tem outros interesses e precisa ficar livre do negócio atual?
Mesmo a empresa sendo saudável, existem concorrentes de igual nível que o comprador possa negociar mais barato?
A negociação vai depender das necessidades dos vendedores e dos compradores. Se a empresa a ser vendida for a única opção do comprador, podemos conseguir um preço superior ao seu valor.
Se a empresa for comum e o comprador tiver n outras opções no mesmo perfil, tecnologia, canais e know how, então o comprador terá mais opções para pagar o menor preço possível.
Em suma, este artigo visa mostrar que existe muito potencial de ganho de margens, escala e eficiência em processos de M&A.
Cada caso deve ser detalhadamente avaliado de maneiro micro e macro para se tomar uma decisão antes de executar uma transação. Mas é sim possível e comum encontrarmos transações em que o valor gerado é maior para vendedor e comprador juntos do que individualmente (a famosa expressão “transação ganha-ganha”, em que os vendedores vendem por mais do que a empresa vale e os compradores compram por menos do que a empresa vale para eles).
Sobre o autor:
Fabio Pagliuso é assessor de M&A e especialista em modelagem financeira, tendo liderado transações nos mais diversos setores da economia, assessorando tanto empresas Brasileiras na busca por investimento como de empresas multinacionais que buscam crescer por meio de aquisições no Brasil.
Fabio fundou o M&A na Prática para fornecer sua visão prática do dia a dia como assessor de M&A em transações de compras, vendas, joint-ventures e fusões que já liderou.
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